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Luto: uma jornada de dor e superação

Quando iniciei a profissão de psicóloga, ainda bem jovem, eu sabia que não tinha ideia do que era viver um luto. Afinal, eu nunca havia perdido um ente querido bem próximo. Até que, um dia, perdi meu pai e, naquele momento, compreendi, de forma visceral, o peso dessa dor. A partir dessa experiência pessoal, o luto deixou de ser um conceito distante e abstrato, e passou a ser uma presença concreta, uma dor silenciosa, mas constante.

Depois da pandemia, fui testemunha de como o luto tomou novas formas, intensificado pela incerteza e o isolamento que marcaram esses tempos. Tenho atendido pacientes de todas as idades, cada um com sua própria jornada de perda. Alguns enfrentam a dor de maneira que parece intransponível, como se a perda fosse uma sombra permanente em suas vidas. Isso me faz refletir: será que existe uma idade certa para se compreender e superar o luto?

O luto, de fato, é uma experiência tão universal quanto individual. Todos nós, em algum momento da vida, seremos confrontados com a perda. Mas, embora o luto seja inevitável, sua vivência é singular. Para alguns, ele é como uma tempestade que chega e se vai deixando um rastro de saudade, mas também a possibilidade de seguir em frente. Para outros, ele é uma neblina densa, que envolve cada aspecto da vida, tornando difícil enxergar a luz.

Nas crianças, o luto pode ser especialmente confuso. A noção de permanência que a morte traz é, para elas, um conceito difícil de entender. A tristeza pode não se manifestar em lágrimas ou palavras, mas em atitudes: mudanças súbitas de comportamento, um retrocesso em habilidades já conquistadas, ou até uma necessidade maior de atenção e segurança. Para os adolescentes, o luto se entrelaça com os desafios de uma fase já naturalmente turbulenta. O sentimento de perda pode se transformar em raiva, em uma busca por respostas não respondidas ou em um questionamento profundo sobre a justiça da vida.

Nos adultos, o luto se apresenta em uma miríade de formas. Alguns experimentam um processo mais curto, onde a dor aos poucos se transforma em uma aceitação serena. Outros, no entanto, podem se sentir paralisados, como se a perda lhes tirasse o chão e a capacidade de seguir adiante.

É nesse cenário de dor e reconstrução que a psicoterapia se coloca como uma aliada. Com suas diversas abordagens, a terapia oferece ferramentas para que o enlutado possa navegar por suas emoções, encontrar sentido no caos e, eventualmente, começar a reconstruir e sem perder o sentido da vida.

Contudo, ao falar de luto, é imprescindível diferenciá-lo da depressão. O luto traz consigo dor, saudade, mas também, por vezes, momentos de alívio, de lembranças que aquecem o coração. A depressão, por outro lado, é uma tristeza persistente, roubando a capacidade de sentir qualquer tipo de conforto ou esperança.

No fim das contas, o luto é uma das lições mais difíceis que a vida nos ensina. Ele nos lembra da impermanência, da fragilidade das coisas que mais prezamos. Mas, é também um convite à transformação. A dor do luto, quando acolhida e trabalhada, pode se tornar uma força, uma maneira de enxergar a vida com mais profundidade e empatia. E, em meio ao sofrimento, a psicoterapia oferece a oportunidade não apenas de curar as feridas, mas de transformá-las em algo que nos fortaleça, que nos ensine sobre a beleza de viver, apesar da dor.

Mariangela Mantovani, psicóloga de casais e famílias, autora dos livros “Filhos Felizes” e “Quando é necessário dizer não” Editora Paulinas, coordenadora do atendimento de Psicologia do Santuário São Judas Tadeu desde 1984.


ENTREVISTA: COMO ENFRENTAR O LUTO?


 

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