Aquele filho mais novo representa toda a humanidade que faz a experiência do pecado em sua existência. O Pai o abraça, o acolhe como um novo filho, lhe dá dignidade régia (de Rei) colocando-lhe um anel em seu dedo, capa e sandálias. O anel simboliza uma nova aliança, uma nova história que durará eternamente. Mesmo o filho tendo pedido e gasto toda a sua parte da herança com os prazeres do mundo, o pai o espera ansioso sempre para lhe encher de abraços, beijos e nobre acolhida.
Agora não tem mais a herança, mas o Pai lhe dá tudo o que lhe pertence, muito mais que uma herança. Uma capa, uma veste que traz proteção, abrigo, segurança, pertença, dignidade eternas. Um par de sandálias, meios para caminhar por seus próprios pés, condições para fazer o caminho, para ir adiante enfrentando os diversos solos da vida, uns mais límpidos, outros com mais detritos, obstáculos, outros ainda mais planos ou mais acidentados porém com a certeza que sempre poderá voltar à casa do Pai que agora lhe garante a herança dos bens eternos.
Assim acontece com o novo filho de Deus, agora batizado. O Batismo é como se fosse essa volta à casa do Pai. Abandonamos nosso pecado e somos acolhidos pelo abraço eterno do Pai.
Como surgiu o Batismo?
A Palavra Batismo significa IMERSÃO, MERGULHO, BANHO, cuja finalidade primeira e mais elementar é purificar, lavar, regenerar. É um rito inclusive de ordem da própria natureza. Todo recém nascido, de alguma forma, ao nascer passa por um banho para remover resíduos que possam estar em seu corpo. Depois, todo banho, na experiência humana mais primitiva, tem esta finalidade de limpeza, desinfecção, asseio, cura, terapia… Ainda hoje, muitas técnicas medicinais recomendam algum tipo de banho.
Com o passar dos séculos os banhos, abluções e mergulhos foram sendo assimilados como ações sagradas, um rito que marca uma fase da vida que termina e outra que inicia, os chamados ritos de passagem, de travessia, de inclusão tribal, de passagem da vida infante para a vida adulta, de admissão a um povo. A medida que as religiões primitivas foram se desenvolvendo, os “batismos” foram pouco a sendo construídos como um ritual e a ele se incorporou outros elementos como provas e testes de resistência, tempos de retiro, ensinamentos com mestres por períodos isolados na mata, entre outras práticas de inserção à vida adulta de tribos, povos, etnias…
Na tradição do povo de Israel, da qual somos herdeiros, há diversos rituais e abluções, purificações em muitos momentos da sua caminhada de Fé. Os fundamentos destes rituais também foram anúncios prévios do que viria a ser o Batismo instituído por Jesus Cristo. Na revelação Bíblica, Deus através dos acontecimentos da história do povo de Israel vai pouco a pouco trazendo o sentido e o valor deste rito. O elemento água é algo que marca diversas experiências de páscoa (passagem) do povo israelita:
Na bela contemplação da criação o autor sagrado expressa: “No princípio o Espírito de Deus pairava sobre as águas” (Gn 1,2c). Indicando as águas como elemento basilar no mistério da criação divina.
Na linda narrativa sobre o dilúvio acontecimento que marca uma ação salvífica de Deus, no qual Ele quer recuperar a humanidade decaída no pecado temos novamente a água como principal elemento (cf. Gn 6,9-8,22).
- Em Moisés e a libertação do Egito
Na história de Moisés, o escolhido para libertar o povo de Israel da escravidão do Egito, Deus conduz Moisés às águas do Nilo por intermédio de sua mãe e as águas o encaminham para o palácio do faraó. Lá encontrado, é criado pela filha do Faraó e assim o plano de salvação do povo se realiza (cf. Ex 2); Na travessia do povo pelo Mar vermelho, onde o povo é salvo da perseguição dos egípcios (Ex 14-15,21); Durante o tempo de passagem pelo deserto, rumo à terra prometida, o povo sentindo sede suplicou a Moisés que providenciasse água. Ele, tocando em uma rocha com uma vara fez com que água jorrasse saciando a sede do povo e salvando-os da morte (cf. Ex 17).
- Na sabedoria, cânticos e salmos do povo de Israel
Em diversos Salmos veremos expressões das experiências do povo de Israel relacionados a água sempre como princípio e símbolo da ação regeneradora, redentora, que marca a presença salvífica de Deus. “Junto aos rios da Babilônia, parecíamos sonhar” (Sl 136,1); “Assim como a corsa suspira pelas águas correntes, suspira por ti ó minha alma, ó Senhor” (Sl 41,2); “Águas do alto céu bendizei o senhor, fontes e nascentes, mares e rios bendizei ao Senhor” (Dn3, 60); “Junto as águas de Meriba te provei” (Sl 80,8); “Para as águas repousantes me encaminha e restaura as minhas forças” (Sl 22,2b).
Na construção e constituição dos templos, as fontes de águas são sinais de purificação e de vida (cf. Ez 47).
Com Jesus então se completa e se inaugura o Sacramento. O momento fundante quando fora batizado por João Batista. Narra o Evangelista que Jesus foi até o Rio Jordão, onde João Batista conclamava o povo de Israel a um rito de purificação e preparação para os tempos Messiânicos. João Batista representa, em síntese máxima o anúncio dos profetas, Jesus vai ao seu encontro e pede para ser batizado. Essa atitude de Jesus é o sinal de que ele cumprirá toda a justiça. Isto significa que, Deus assume plenamente a humanidade e a purificará por ação de Cristo Jesus.
Na narrativa, o Evangelista apresenta que no momento do Batismo, do céu desce o Espírito de Deus em forma de uma pomba (sinal do dilúvio, inaugura-se a nova humanidade, agora recriada pela obra de Cristo), uma voz do céu diz: “Este é o meu Filho muito amado, em quem pus toda a minha graça” – a voz de Deus é a Palavra que confirma o cumprimento da promessa feita aos profetas e a confirmação de que Jesus é o messias que libertará a humanidade definitivamente das amarras da morte e do pecado.
Agora, pois, inverte-se o rito, Jesus passa a ser não o que se submete ao rito batismal de João, mas ao realizar tal gesto, ele se torna o protagonista. Ao ser batizado santifica as águas e as tornam aptas para que os que forem batizados em seu nome participem da sua obra de Salvação.
A água, ungida pela ação do Espírito Santo, o Espírito de Cristo, torna-se sinal de morte e ressurreição. Assim o mergulho nas águas é o mergulho na Vida de Cristo, “com ele morremos, com ele viveremos”. O batismo de Cristo não é tão somente uma purificação, mas o Batismo no seu Espírito, recebendo então a graça de uma nova vida, a “vida em abundância” que Jesus veio nos proporcionar.
No episódio do Batismo de Jesus, se antevê sua Páscoa, paixão, morte e ressurreição. A voz do Pai confirma este gesto que revela o modo como todos os homens e mulheres da história poderão participar dessa obra de salvação, unidos à vida do Filho eterno, Jesus. Com Ele nos tornamos mais que filhos de Deus, nos tornamos filhos muito amados de um Deus que se revela um Pai, ou seja, próximo de nós, que nos assiste em todos os momentos da nossa vida (cf. Mt 3,13-16; Mc 1,7-11; Lc 3,1-22).
Na vida de Jesus, em vários momentos veremos novamente a alusão que Ele faz à água, sinal que transmite a sua páscoa:
– Nas Bodas de Caná: A água que servia para purificação fora transformada em vinho novo, da melhor qualidade. Jesus reestabelece de modo novo a aliança de amor entre Deus e o Povo (Jo 2,1-23).
– O encontro de Jesus com Nicodemos (cf. Jo 3,1-21).
– A cura do paralítico em Betesda: Jesus cura um paralítico que ficava na piscina do templo esperando uma água que pudesse “purificá-lo” e sanar sua enfermidade. Jesus se torna a verdadeira água que cura o paralitico e o faz mover-se para assumir sua vida e sua história (cf. Jo 5,1-11).
– Grandes sinais que Jesus realiza nas águas do mar: A pesca milagrosa (cf. Lc 5,1-11); Acalmando a tempestade (cf. Mt 8,23-27; Mc 4,35-41; Lc 8,22-25); Jesus que anda sobre as águas e a experiência da fé pascal de Pedro (cf. Mt 14,22-33; Mc 6,45-51; Jo 6,16-21).
– O encontro de Jesus com a Samaritana: revelando-lhe que Ele é a água que cessará toda a sede do coração e da vida do ser humano (cf. Jo 4, 1-29).
– O mandato missionário aos seus discípulos, outro relato fundante do Sacramento do Batismo: “Ide e fazei discípulos todas as nações, batizando-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo” (cf. Mt 28,18-20; Mc 16,15-18).
- Nos demais textos do Novo Testamento
– No Atos dos Apóstolos vemos o testemunho da grande missão da primeira comunidade Apostólica. Diversos momentos no nascimento das primeiras comunidades Cristãs onde os apóstolos administram este precioso Sacramento, marcando sempre o início da Igreja (cf At 2,38-41; 5,28; 10,12-44; 19,5).
– São Paulo também apresentara diversos textos doutrinais, teológicos e ensinamentos sobre o Batismo (cf. Rm 6,3-4; Gl 3, 26-28; Cl 2,11-13).
– Nos escritos joaninos temos uma bela e profunda teologia batismal mencionando a dignidade dos que são batizados (cf. 1Jo 5-6,12; Ap 22,13-15).
Depois, ao longo da História da Igreja teremos diversos santos, místicos, teólogos que vão clarificando e compreendendo com mais profundidade este Sacramento. Santo Agostinho, por exemplo, nos traz um belo ensinamento sobre o Batismo. Parafraseando-o: Os que recebem o Sacramento do Batismo saem do útero materno, da mãe natural (biológica) e pelo Batismo são introduzidos, fecundados, mergulhados num segundo útero, o útero da “mãe” sobrenatural que é a comunidade de Jesus, a sua Igreja. Jesus nutre a Igreja com todas as suas bênçãos e graças operadas por meio do seu Espírito, o Espírito Santo. Ele, o Espírito Santo é o próprio Amor do Pai e do Filho transbordado sobre Igreja. Dentro deste “útero” banhado e nutrido pela fonte de água viva do Espírito Santo, o novo(a) filho(a) de Deus é gerado(a) para o seu definitivo nascimento, que se dará no dia de sua morte. Morte esta que é o fim da vida terrena e passagem (páscoa) para a vida eterna, a Vida de fato.
Quem pode receber este sacramento?
Todas as pessoas que sentem o desejo de seguir a Jesus Cristo e viver sua proposta de vida, desde que não tenha nenhum impedimento para tal. Isto implica a inserção progressiva e ativa em sua comunidade de discípulos e discípulas, a Igreja.
Desde tradição mais antiga da Igreja, crianças também podem ser batizadas, assim como vigora hoje. Elas podem receber, mediante o desejo e o compromisso de seus familiares que vivem a plenitude da consciência deste sacramento e desejam oferecer esse bem divino aos seus filhos. Não se trata de usurpar-lhes a liberdade, mas dar-lhes o melhor que se pode oferecer a um filho; a verdadeira liberdade de se tornarem filhos de Deus segundo a graça de Jesus Cristo.
Considerando toda explicação acima é evidente que o Batismo não se trata de uma SIMPLES BENÇÃO, não se trata DE UM PASSE MÁGICO para tirar mau olhado, não se trata de uma TRADIÇÃO FAMILIAR para agregar créditos com compadres e comadres, não se trata de uma OBRIGAÇÃO SOCIAL nem pretexto para divertimento familiar. Batismo É UM COMPROMISSO QUE ESTA EM JOGO O MAIS IMPORTANTE DA VIDA DE UMA PESSOA, a sua vida espiritual.
O Batismo de outras igrejas cristãs é considerado válido pela Igreja Católica?
Algumas sim, aquelas que mantém o ritual nas suas prescrições fundamentais e o diálogo ecumênico com a Igreja Católica. São apenas estas:
- Igrejas Orientais (“Ortodoxas” que estão em comunhão plena com a Igreja Católico-Romana das quais, pelo menos, seis se encontram presentes no Brasil);
- Igreja Vétero-Católica;
- Igreja Episcopal do Brasil (“Anglicanos”);
- Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB);
- Igreja Evangélica Luterana do Brasil (IELB);
- Igreja Metodista
O Batismo de algumas religiões é aceitável com algumas restrições e mediante comprovação de preservação dos elementos essenciais do rito do batismo e registro:
- Igrejas presbiterianas;
- Igrejas batistas;
- Igrejas congregacionalistas;
- Igrejas adventistas;
- A maioria das Igrejas pentecostais (Assembleia de Deus, Congregação Cristã do Brasil, Igreja do Evangelho Quadrangular, Igreja Deus é Amor, Igreja Pentecostal “O Brasil para Cristo”);
- Exército da Salvação (este grupo não costuma batizar, mas quando o faz, realiza-o de modo válido quanto ao rito);
- demais denominações Cristãs a Igreja Católica o não considera válido.
Por fim, vale salientar que o BATISMO É UM apenas, e não existe REBATISMO, ou OUTROS BATISMOS. A não ser em caso de absoluta dúvida se o determinado candidato o recebeu validamente ou não; isso ocorre mediante um processo simples de investigação da paróquia ou comunidade em que se pede o sacramento. Ainda vale ressaltar que para receber outros Sacramentos é necessário o Batismo, pois como dito, ele é porta de entrada na vida da Igreja e na vida sacramental.
Aprofundamento
Para se aprofundar mais sobre este sacramento acesse os sites abaixo:
http://www.vatican.va/archive/cathechism_po/index_new/p2s2cap1_1210-1419_po.html
https://www.cnbb.org.br/?s=Batismo+
http://www.liturgia.pt/rituais/Baptismo.pdf
http://www.liturgia.pt/rituais/RICA.pdf